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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Cortinas Relutantes

Para toda e qualquer platéia, em qualquer parte do mundo, um bom espetáculo possui sempre um vilão, personagem desonesto que ao final paga por seus delitos e cuja evidente ausência de escrúpulos permite que cada espectador infle de orgulho por sua pretensamente insuspeita idoneidade.No caso brasileiro, no entanto, o roteiro da peça apresenta ainda um agravante: o fato de a platéia estar cada vez mais afeita à idéia de fazer coro aos vilões em suas atuações escandalosamente ilícitas, provando que a falha moral na escrita desta peça é igualmente estrutural e que a idoneidade do espectador anda longe de estar livre de suspeitas.
A população brasileira tem, infelizmente, assistido todos os dias a espetáculos estapafúrdios de corrupção escancarada e de uma desonestidade que desconhece limites, que têm como cenário o palco em que se transformou a capital federal. O elenco é a classe política, cujos personagens, quase que hilariantes, variam de “grandes lobos” em peles de cordeiros (dotados de cestos cheios de laranjas) a “injustiçados” coronéis bigodudos, patriarcas de grandes famílias. Para a felicidade dos cofres públicos e dos amantes do bom e velho dramalhão, é necessário que se admita que se tem visto ultimamente, já não sem tempo, alguns finais minimamente acertados para tais situações, obviamente regados às costumeiras interpretações fantásticas do bom e velho elenco.
Em meio a esse turbilhão de escândalos, no entanto, há algo ainda mais preocupante, se é que isso é possível. É o fato de os brasileiros, espectadores destas cenas ridículas que protagonizam nossos políticos profissionais, parecerem muito confortáveis ao apontar o dedo para as desonestidades alheias quando, infelizmente, um fedor ainda maior vem da platéia, já que no Brasil a desonestidade parece ter, há muito, impregnado as raízes da formação cultural de seu povo. É visível e inegavelmente inerente à maior parte da população o impulso ao jeitinho brasileiro, de modo que a sociedade passa a ter exatamente os políticos que merece. A platéia, vergonhosamente satisfeita, assiste àquilo a que pagou para ver, assiste ao espetáculo encenado pela trupe de atores que ela mesma ensaiou.
Desde os primórdios da colonização brasileira, a má fé tem estado presente e arrasta-se de geração para geração como um legado sujo, maldito, do qual a nação não consegue ver-se livre. Fica claro então que, embora a desonestidade é que tenha se mostrado hereditária, o deveriam ser a idoneidade e os princípios morais e éticos. Apenas de pai para filho, apenas com uma mudança drástica e urgente na maneira com a qual se está educando essa nova geração é que poderemos reduzir o impacto marcante da corrupção nesta sociedade.
É urgente a tomada de decisões rumo ao encontro de uma solução definitiva para o problema. Para tanto, faz-se imprescindível o fim do medo de resultados a longo prazo, atrelado à essa sociedade do hedonismo e imediatismo, simplesmente porque não é possível uma transformação desta magnitude e proporção em curto espaço de tempo. Parece impossível? Sim. Não há precedentes na história para a transformação de que necessita o Brasil? Verdade. Porém a dura realidade é que não há jeito de o Brasil alçar sua tão sonhada subida ao grupo dos países desenvolvidos (subida essa que nunca esteve tão próxima) sem dar início à derrocada da sua desonestidade cultural, principal entrave ao crescimento econômico e social de um país tão rico, e de gente tão capaz e batalhadora.
É por isso que se deve começar já. O trabalho é longo, mas gente capaz de fazê-lo não nos falta. As soluções passam por atitudes práticas e relativamente simples, para um povo que se já se livrou do julgo de uma metrópole exploradora e derrubou mais de três regimes autoritários ao extremo. Boas idéias há de sobra, como a inserção, nos currículos escolares, de disciplinas que versem, não sobre o velho besteirol militar de educação moral e cívica, mas à respeito de cidadania, altruísmo e valores verdadeiramente humanos. Outra boa idéia, é a realização de tribunais populares, no qual o próprio povo denuncie os abusos de comando das autoridades, como recentemente ocorreu no estado do Maranhão, no qual a sociedade civil mobilizou as massas populares oprimidas por um judiciário corrupto e elitista, denunciando e permitindo a vivência, pela população, de um protagonismo inspirador, até então inédito para sua maioria.
Portanto, a construção de um futuro mais digno, no qual se veja uma platéia que pague para ver coisa melhor, só será possível com uma reforma de base. Isso porque a verdade inegável é que esse espetáculo a que se assiste agora, já passou da hora de acabar; este dramalhão patético e suas grandes famílias no elenco, seus esquemas e fraudes, já estão dignos de pena. As luzes já estão baixas, os aplausos, graças a Deus, estão cessando e as pessoas começam a levantar-se indignadas de seus assentos. É hora de fechar as cortinas.

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